Personagem marcante na luta contra a ditadura, Dom Paulo Evaristo Arns morre aos 95 anos
Religião
por redação
Morreu na manhã desta quarta-feira (14), aos 95 anos, o cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, Arcebispo Emérito da Arquidiocese de São Paulo. Ele estava hospitalizado desde o final de novembro. O comunicado da morte do cardeal foi feito em nota divulgada pela Arquidiocese de São Paulo. O arcebispo metropolitano, Dom Odilo Scherer, afirmou que Arns “entregou sua vida a Deus, depois de tê-la dedicado generosamente aos irmãos neste mundo”.
“Comunico, com imenso pesar, que no dia 14 de dezembro de 2016 às 11h45, o Cardeal Paulo Evaristo Arns, Arcebispo Emérito de São Paulo, entregou sua vida a Deus, depois de tê-la dedicado generosamente aos irmãos neste mundo.
Louvemos e agradeçamos ao “Altíssimo, onipotente e bom Senhor” pelos 95 anos de vida de Dom Paulo, seus 76 anos de consagração religiosa, 71 anos de sacerdócio ministerial, 50 de episcopado e 43 anos de cardinalato.
Glorifiquemos a Deus pelos dons concedidos a Dom Paulo, e que ele soube partilhar com os irmãos. Louvemos a Deus pelo testemunho de vida franciscana de Dom Paulo e pelo seu engajamento corajoso na defesa da dignidade humana e dos direitos inalienáveis de cada pessoa.
Agradeçamos a Deus por seu exemplo de Pastor zeloso do povo de Deus e por sua atenção especial aos pequenos, pobres e aflitos. Dom Paulo, agora, se alegre no céu e obtenha o fruto da sua esperança junto de Deus!
Convido todos a elevarem preces de louvor e gratidão a Deus e de sufrágio em favor do falecido Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns. Convido também a participarem do velório e dos ritos fúnebres, que serão realizados na Catedral Metropolitana de São Paulo“.
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo metropolitano de São Paulo
Nascido em 1921, em Forquilhinha, no Sul do de Santa Catarina, Dom Paulo ingressou na Ordem Franciscana em 1939, e iniciou seus trabalhos como líder religioso em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Formou-se em teologia, no Rio de Janeiro, e filosofia, em Curitiba. Recebeu sua ordenação sacerdotal em 1945, época em que se dirigiu à França, onde cursou letras, pedagogia e também defendeu seu doutorado.
Em 1966 recebeu foi ordenado bispo auxiliar de São Paulo, sendo, quatro anos depois, nomeado arcebispo metropolitano, exercendo a função até 1998, quando renunciou, por limite de idade, tornando-se arcebispo-emérito.
Foi criado cardeal em 1973, pelo Papa Paulo VI. Como cardeal eleitor, participou dos dois conclaves, de agosto e de outubro de 1978. Participou ainda, como cardeal não-votante, dos conclaves de 2005 e de 2013. Em 9 de julho de 2012 tornou-se o presbítero do Colégio dos Cardeais, por ser aquele que há mais tempo foi elevado à dignidade cardinalícia entre todos os cardeais-presbíteros, sendo também o mais antigo de todos os membros do Colégio Cardinalício.
Ao longo de sua trajetória, trabalhou como jornalista, professor e escritor, tendo publicado 57 livros. Durante a Ditadura Militar, destacou-se por sua luta política, em defesa dos direitos humanos, contra as torturas e a favor do voto nas Diretas Já. Ganhou projeção na militância em janeiro de 1971, logo após tornar-se arcebispo de São Paulo, e denunciar a prisão e tortura de dois agentes de pastoral, o padre Giulio Vicini e a assistente social Yara Spadini. No mesmo ano, apoiou Dom Hélder Câmara e Dom Waldyr Calheiros, que estavam sendo pressionados pelo regime militar. Entre os livros de maior repercussão está a obra “Brasil Nunca Mais”, um trabalho de pesquisa que teve papel fundamental na identificação e denúncia dos torturadores do regime militar. O documento reuniu informações em 707 processos do Superior Tribunal Militar (STM) revelando a extensão da repressão política no Brasil.
Em 1972 criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo e, como presidente regional da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), liderou a publicação do “Testemunho de paz”, documento com fortes críticas ao regime militar que ganhou ampla repercussão à época.
Presidiu celebrações históricas na Catedral da Sé, no Centro de São Paulo, em memória de vítimas da Ditadura Militar. Dentre eles, do estudante universitário Alexandre Vannucchi Leme, assassinado em 1973, e o ato ecumênico em honra do jornalista Vladimir Herzog, assassinado no DOI-CODI, em São Paulo, em 1975.
Em 1983, foi um dos criadores da Pastoral da Criança, com o apoio de sua irmã, Zilda Arns, que morreu no terremoto de 2010 no Haiti, onde realizava trabalhos humanitários.
Por seus feitos, recebeu inúmeros prêmios e homenagens no Brasil e no exterior. Dentre eles, o Prêmio Nansen do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), o Prêmio Niwano da Paz (Japão), e o Prêmio Internacional Letelier-Moffitt de Direitos Humanos (EUA), além de 38 títulos de cidadania.