Descoberta liderada por brasileiros derruba teoria do século XIX
Descoberta do anel se deu através da técnica de ocultação estelar, observadas entre 2018 e 2021,
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por Marcelo Marcos
Uma nova descoberta no Sistema Solar é divulgada por uma equipe de pesquisadores liderada por brasileiros. Dez anos após o primeiro anúncio da equipe, então liderada pelo professor do Campus Curitiba, Felipe Braga Ribas, da constatação do primeiro sistema de anéis ao redor de um pequeno corpo do sistema solar, agora foi a vez do professor Bruno Morgado, do Observatório do Valongo (UFRJ), que liderou a equipe para mais uma constatação inédita: a presença de um terceiro asteroide com um anel, desta vez ao redor do Quaoar. Segundo os cientistas, esta descoberta derrubaria uma teoria do século XIX. A novidade foi publicada nesta quarta-feira, dia 08, na Revista Nature.
O Quaoar está a uma distância de 41 vezes a da Terra ao Sol, possui mais de 1000 km de diâmetro e é candidato a planeta-anão. Ele está na região além do Planeta Netuno por isto é considerado um objeto Transnetuniano ou TNO (fósseis intactos da formação do Sistema Solar).
Para os pesquisadores, o que torna essa descoberta surpreendente é que o anel do Quaoar está distante cerca de 4.100 km do corpo principal, o que corresponde a cerca de 7,4 raios, ficando além do limite de Roche.
Em 1848, Edouard Roche constatou que existe uma distância para que um corpo mantenha-se coeso, sem se desintegrar devido à forças de maré, causada pela atração gravitacional. Ficou conhecido então o “limite de Roche”.
“De acordo com a teoria, um disco de partículas dentro desse limite não pode se acumular e formar uma lua, permanecendo sempre como um anel. Por outro lado, um disco fora desse limite, como o anel descoberto ao redor de Quaoar, deve se agregar e tornar-se um satélite, o que ocorreria em poucos anos”, citam os cientistas no artigo publicado na Revista Nature.
O professor Felipe Ribas comenta que, até agora, as observações confirmavam a teoria de Roche: todos os anéis dos quatro planetas gigantes, além dos anéis de Chariklo e Haumea (descobertas também anunciadas pelos pesquisadores em 2014 e 2017), encontram-se dentro ou perto do limite de Roche. Porém, o anel de Quaoar modifica essa teoria. “Agora teremos que aumentar nossa área de buscas e observações e propor modelos mais elaborados para explicar como um anel se mantém tão distante do corpo principal”, destaca.
A equipe apresentou no artigo simulações computacionais considerando teorias colisionais mais recentes e adequadas à baixas temperaturas que podem explicar como o anel de Quaoar pode existir fora do limite de Roche. “Anéis em pequenos corpos podem ser mais comuns do que pensávamos e podem nos ajudar a responder questões do Sistema Solar, como a formação de luas em torno de planetas, por exemplo”, completa o professor.
Além dos professores Bruno Morgado (UFRJ) e Felipe Braga Ribas (UTFPR), a equipe de cientistas conta ainda com a participação de outros 11 pesquisadores e pós-graduandos de diferentes instituições brasileiras: Observatório Nacional (Rio de Janeiro); Grupo de Dinâmica Orbital e Planetologia, UNESP-Guratinguetá; Laboratório Interinstitucional de e-Astronomia (Rio de Janeiro); e Universidade Federal de Uberlândia (Uberlândia/MG). Já a equipe internacional é formada por pesquisadores do Observatório de Paris (França), do Instituto de Astrofísica de Andalucía (Espanha), Universidade de Oulu, (Finlândia), da missão espacial CHEOPS da Agência Espacial Europeia (ESA), entre outros, bem como por astrônomos amadores.
Observação
Segundo o relato dos astrônomos no artigo, a descoberta do anel se deu através da técnica de ocultação estelar, observadas entre 2018 e 2021, que apresentaram pequenas quedas de brilho na luz das estrelas ocultadas. Isso se deu em momentos antes e depois do próprio Quaoar passar na frente das estrelas.
A partir da medida destas quedas, as propriedades físicas do anel foram determinadas. Além disso, foi detectada uma estrutura muito mais densa que as demais partes do anel, só vista em planetas gigantes e não em pequenos corpos.
O trabalho contou com a participação de telescópios profissionais, como o Gran Telescópio das Canárias, o telescópio espacial CHEOPS da Agência Espacial Europeia (ESA), telescópios robóticos e pequenos telescópios da comunidade amadora.
10 anos da primeira descoberta dos anéis
Em 2013, a equipe internacional, então liderada pelo professor da UTFPR Felipe Ribas, descobriu, os primeiros anéis em torno de pequenos corpos, ao redor do asteroide Chariklo, artigo publicado em 2014 também na Revista Nature. Em 2017, a mesma equipe descobriu que o planeta anão Haumea também possui ao menos um anel.
Em 2013 o professor Ribas publicou o primeiro estudo sobre as propriedades físicas de Quaoar obtidas com a técnica de ocultações estelares. Além disso, o professor e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Física e Astronomia (PPGFA) da UTFPR, orienta alunos que aprimoram estes resultados sobre as propriedades de Quaoar e seu anel, além de estudar outros corpos do sistema solar.
Assessoria