Municípios podem realizar o transporte de estudantes universitários, diz TCE
Geral
por Evandro Artuzzi
Os municípios paranaenses podem realizar transporte universitário com veículos destinados ao transporte escolar, desde que estejam atendidas plenamente as necessidades do ensino fundamental e da educação infantil e não haja o comprometimento dos percentuais mínimos da Receita Corrente Líquida (RCL) vinculados pela Constituição Federal à manutenção e ao desenvolvimento do ensino.
Esse serviço de transporte pode ser prestado pelo município gratuitamente; ou, de acordo com as disponibilidades financeiras, mediante a cobrança de preço público, cujo valor pode ser instituído por meio de ato infralegal, como um decreto.
Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pela prefeita do Município de Andirá, Ione Elizabeth Alves Abib, por meio da qual questionou se o município poderia realizar o transporte universitário para outras cidades da região com veículos da prefeitura; e, ainda, se tal serviço poderia ser gratuito ou como deveria ser fixada uma tarifa.
Instrução do processo
A Procuradoria Municipal de Andirá concluiu que o município pode realizar o transporte universitário com veículos da prefeitura para outras cidades da região, desde que não haja prejuízo às finalidades do apoio concedido pela União e seja respeitado o percentual mínimo de aplicação na educação infantil e no ensino fundamental. Segundo o parecer jurídico, a prefeitura pode prestar o transporte gratuitamente ou instituir um preço público, sem finalidade lucrativa, por meio de decreto executivo.
A Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca (SJB) do TCE-PR indicou a existência de duas decisões sobre o tema no âmbito do Tribunal: Acórdão 11/07 – Tribunal Pleno (Consulta nº 230731/01) e Acórdão nº 3472/14 – Tribunal Pleno (Consulta nº 347446/13).
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR opinou pela possibilidade de realização do transporte universitário pela prefeitura, desde que satisfeitas as necessidades do ensino básico. A unidade técnica afirmou que o serviço pode ser gratuito, mas, em razão do seu caráter comercial, também pode haver a cobrança de preço público pela sua prestação, na medida de seu custo; e a tarifa pode ser fixada mediante decreto expedido pelo chefe do Poder Executivo
O Ministério Público de Contas (MPC-PR) manifestou-se para que a Consulta fosse respondida nos termos sugeridos pela instrução da CGM.
Legislação e jurisprudência
O inciso V do artigo 23 da Constituição Federal (CF/88) dispõe que é competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência.
O artigo 211 da CF/88 fixa que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. O parágrafo 1º desse artigo expressa que a União organizará o sistema federal de ensino, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios.
O parágrafo 2º desse mesmo artigo estabelece que os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil; e o parágrafo seguinte (3º) dispõe que os estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.
O artigo 212 da CF/88 fixa que a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18%, e os estados, o Distrito Federal e os municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
Em seu inciso V, o artigo 11 da Lei 9.394/1996, que institui as diretrizes e bases da educação nacional, expressa que os municípios serão incumbidos de oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino. E o inciso VI desse artigo prevê que o município terá a incumbência de assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal.
O artigo 5° da Lei Federal nº 12.816/2013, que altera as disposições da Lei nº 12.513/11 (Lei do Pronatec), estabelece que a União, por intermédio do Ministério da Educação, apoiará os sistemas públicos de educação básica dos estados, Distrito Federal e municípios na aquisição de veículos para transporte de estudantes, na forma do regulamento.
O parágrafo único desse artigo dispõe que, desde que não haja prejuízo às finalidades do apoio concedido pela União, os veículos, além do uso na área rural, poderão ser utilizados para o transporte de estudantes da zona urbana e da educação superior, conforme regulamentação a ser expedida pelos estados, Distrito Federal e municípios.
O Acórdão nº 3472/14 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 347446/13) prevê que, desde que estejam satisfeitas as necessidades da educação infantil e do ensino fundamental, é possível a atuação em outras áreas, como no ensino superior, por meio do transporte de estudantes.
Decisão
O relator do processo, conselheiro Ivan Bonilha, lembrou que o transporte de estudantes constitui meio de acesso à educação a ser proporcionado de forma comum pela União, estados, Distrito Federal e municípios. Ele ressaltou que, no âmbito da competência comum, o município deverá atuar prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil, mas isso não impede sua atuação em outros níveis do ensino.
Bonilha destacou, inclusive, que a Lei nº 9.394/96 permite essa atuação desde que as necessidades de sua área de competência estejam plenamente atendidas e não haja o comprometimento do percentual mínimo de 25% das receitas dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino.
O conselheiro alertou que a utilização dos veículos destinados ao transporte de estudantes deve ser regulamentada, para evitar desvio de finalidade; e que cabe ao município estabelecer se o serviço será prestado de forma gratuita ou onerosa, bem como os critérios para a concessão do benefício, observadas as disponibilidades financeiras.
Finalmente, o relator sustentou que, caso haja cobrança pelo uso transporte, o valor poderá ser instituído por meio de decreto ou outro ato infralegal, por não se tratar de espécie tributária e não se sujeitar ao princípio da legalidade estrita.
Os conselheiros aprovaram o voto do relator, por unanimidade, na sessão do Tribunal Pleno de 4 de dezembro. O Acórdão nº 3862/19 – Tribunal Pleno foi veiculado, em 19 de dezembro, na edição nº 2.210 do Diário Eletrônico do TCE-PR, disponível no portal www.tce.pr.gov.br.
Fonte: Assessoria